Quando entrei, fui abraçada por suas filhas, que herdaram da mãe os olhos amendoados, de um castanho quase verde. Ela me convidou a sentar no colchão que fazia as vezes de sofá e estava coberto por uma manta artesanal. Encostei entre as almofadas e apreciei a visão da janela grande, que exibia uma árvore com galhos e folhinhas que encostavam na vidraça. De um aparelho de som veio a música que misturava instrumentos naturais aos clássicos. Sons de cítara e flauta encheram o ar.
Adélia foi até a cozinha preparar um chá. Ela tinha conseguido um ramalhete de hortelã e estava feliz por isso. Conversamos sobre seus pais, seu trabalho como educadora e antropóloga e sobre um livro que estava lendo naquelas semanas. Ela também me falou sobre o quanto vinha lutando para manter os valores humanos no coração de suas meninas, às quais criava sozinha desde a separação. Entre risinhos, as três me trouxeram uma bandeja forrada com primor. Dentro dela havia uma chaleira, geleia caseira e um prato decorado, com biscoitos de gergelim. Sentadas no colchão, admiramos o piso antigo. O desenho dos nós da madeira em vários tons era bonito à luz da tarde. O armário da sala vinha acompanhando a infância das meninas e estava guardando louças descasadas que contavam histórias.
Depois do chá, fomos até o quarto, onde desenhos escolares enfeitavam as paredes. A filha mais jovem se dispôs a dançar para nós, usando um vestido bordado no peito. Chegou a hora de ir embora e, já no térreo, fui convidada a conhecer algumas pedras secretas, escondidas ao pé da árvore grande, e a observar o musgo e as samambaias que nasciam no tronco. Essas samambaias ainda povoam nossas lembranças sobre aquela tarde inesquecível.